Diretora escancara bastidores da Globo com assédio e violência sexual

Cininha de Paula compartilhou experiências chocantes durante painel no Festival de Cinema de Vassouras
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No Festival de Cinema de Vassouras – No Vale do Café, na tarde desta terça-feira (20), a renomada diretora Cininha de Paula liderou um painel impactante, deixando a plateia boquiaberta ao relatar suas vivências na Rede Globo, onde atuou por mais de três décadas. Mesmo afastada da emissora desde 2019, ela revelou ter sido vítima de diversos tipos de assédio, incluindo violência sexual verbal.

Declarando o sofrimento como algo inenarrável, a diretora compartilhou: “Quando você estava de TPM, triste ou no período pré-menstrual, seu chefe diria: ‘Eu não te disse para encostar a barriga no fogão e fazer uma comida? Lavar uma louça? O que isso tem a ver comigo? Eu não te mandei estar aqui'”.

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Embora tenha construído sua carreira na TV como diretora, Cininha de Paula iniciou seu trabalho na Globo como atriz. Porém, em pouco tempo, considerou a atuação fácil demais e passou a almejar um cargo na direção, uma área notoriamente restrita às mulheres. Apesar das dificuldades, ela persistiu até encontrar uma oportunidade. Entretanto, seus piores pesadelos estavam prestes a se concretizar.

“Foi extremamente doloroso ser diretora. Eu achava que, ao fazer a transição para a direção, o assédio diminuiria. Fui assediada sexual e moralmente quando era atriz. Enfrentei todos os tipos de assédio e acreditei que diminuiriam quando me tornei diretora. No entanto, os assédios sexuais e morais continuaram. Com o passar dos anos, diminuíram, restando apenas os morais. Nesse ponto, a situação melhorou (risos). Recebia cantadas até quase virar uma avó. Era algo absurdo”, relembrou.

Sem encontrar brechas para ascender na carreira, os consagrados Walter Avancini (1935-2001) e Jorge Fernando (1955-2019) se tornaram obstáculos no caminho de Cininha para se tornar diretora na Globo. Durante o painel, ela compartilhou que ambos a rejeitaram inúmeras vezes. Foi somente com a ajuda de Daniel Filho, um de seus mentores na direção, que ela conseguiu abrir caminho dentro da emissora.

“Já estava sem contrato com a Globo, mas recorri a Daniel Filho, que se ofereceu para me ajudar. Ele pediu que eu batesse na porta de Jorge Fernando e dissesse que ele havia ordenado minha integração à equipe. Então, fui até lá, dei o recado e Jorge me vetou novamente. Ele ainda disse: ‘Vá reclamar com Daniel, diga que eu não te quero aqui’. E eu não fiz isso”, relembrou Cininha.

Diante de tantos obstáculos, a diretora decidiu criar um curso para jovens talentos e buscar um texto para montar sua própria peça teatral e direcionar o espetáculo. Foi nesse momento que ela teve a ideia de adaptar um texto infantil de Jorge Amado (1912-2001) e transformá-lo em um espetáculo musical, chamando a atenção da comunidade artística.

“A esposa de Jorge Amado, Zélia Gattai (1916-2008), ainda estava viva na época, assistiu e gostou muito. Realizei um espetáculo lindo, ganhei todos os prêmios. Roberto Talma (1949-2015) viu, adorou e disse: ‘Vem comigo, garota, vou te levar para a TV Globo’. Ele me deu essa oportunidade, e foi através dele que me tornei diretora. Meu primeiro trabalho foi como assistente em Mandala (1987). Os protagonistas eram Vera Fischer e Felipe Camargo. Aquela dupla não era fácil”, compartilhou Cininha, rindo.

Sobrinha de Chico Anysio (1931-2012), Cininha deixou a Globo em 2019 e tem se dedicado a projetos fora da emissora líder de audiência. Seu trabalho mais recente foi na série musical O Coro, produzida por Miguel Falabella para o Disney+.

“Hoje, tenho que superar outras questões, o que chamamos de ‘idadismo’. Não é apenas mostrar que você aguenta o tranco, mas sim provar que ainda é capaz de aguentar o tranco. Sinto-me muito feliz por ter percorrido esse caminho repleto de obstáculos, ter caído algumas vezes e chorado muito, mas, no fundo, consegui adquirir algo valioso para levar adiante na minha vida“, avaliou Cininha de Paula.

Sarah Oliveira
Sarah Oliveira

Uma amante das palavras em uma jornada incessante de descoberta. Originária de São Paulo, encontro nas nuances da linguagem minha paixão. Com formação em Comunicação, tenho o prazer de guiar você pelos intrincados caminhos das notícias, oferecendo uma perspectiva única sobre o que acontece no Brasil e no mundo.

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