Vítima de estupro tem aborto negado três vezes em São Paulo: ‘Tive que ouvir coração do feto’

Direito suprimido

Maria Clara (nome fictício), vítima de estupro, teve o aborto legal negado por três hospitais na capital paulista. Ela só conseguiu realizar o procedimento em outro estado, com a ajuda da Defensoria Pública de São Paulo.

No Brasil, o aborto é permitido em três situações: quando o feto é anencéfalo, quando há risco de vida para a mãe, ou quando a gravidez é fruto de estupro. Apesar disso, Maria Clara enfrentou diversas barreiras.

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Ao descobrir a gravidez aos 24 semanas, ela procurou o Hospital da Mulher, mas foi informada de que, devido à gestação avançada, deveria buscar outra unidade e a Defensoria Pública.

Eu fiz o exame de sangue, fiz o ultrassom e passei na médica. Ela me falou que como a gestação estava muito avançada, eu teria que procurar outra unidade e ajuda na Defensoria. A médica só falou que não poderia fazer e pronto. Depois ela me encaminhou para assistente, e a assistente me disse que eu teria que procurar ajuda. Só me passaram o endereço da defensoria e eu fui por conta própria”, relembra.

Negativas em Hospitais

Com o apoio da Defensoria Pública, Maria Clara foi encaminhada ao Hospital Municipal do Campo Limpo, onde novamente teve o aborto negado. A situação se agravou quando, em dezembro de 2023, a Prefeitura de São Paulo suspendeu o serviço de aborto legal no Hospital Municipal e Maternidade da Vila Nova Cachoeirinha, a única unidade no estado que realizava o procedimento após 22 semanas.

Em sua terceira tentativa, no Hospital Municipal Tide Setubal, Maria Clara enfrentou um atendimento traumático, sendo obrigada a ouvir os batimentos cardíacos do feto. Ela relatou que a equipe médica tentou convencê-la a manter a gravidez até o nascimento.

A equipe médica ainda tentou convencê-la a não realizar o aborto.Me falaram para tentar segurar o neném até nove meses, que eles me dariam laqueadura, que iam cuidar de mim e me buscar para fazer a cirurgia e tudo mais. Eu fui embora para casa acabada, não sei nem explicar. Eu já estava pensando como fazer em casa sozinha porque eu não tinha condições”.

Como o atendimento estava agendado, achei que eu ia chegar e iam estar me esperando. O atendimento foi péssimo, tive que falar perto de pessoas e o pior de tudo foi precisar ouvir o coração do feto. Eu pedi para ele [profissional de saúde] parar e tirar, levantei e saí da sala”, desabafa.

Realização do Procedimento

Finalmente, Maria Clara conseguiu realizar o aborto em outro estado, após a Defensoria Pública entrar em contato com um projeto que facilitou o processo. Ela descreveu o atendimento como respeitoso e eficiente.

Projeto de Lei Controverso

A situação de Maria Clara ocorre em meio à tramitação do PL 1094/24 na Câmara dos Deputados, que visa equiparar o aborto realizado após 22 semanas ao crime de homicídio simples. O projeto, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), da bancada evangélica, propõe penas severas para abortos realizados após esse período, mesmo em casos de estupro.

Reflexões e Declarações

A defensora pública Paula Sant’Anna comparou o atendimento recebido por Maria Clara a tortura, enfatizando as barreiras enfrentadas por mulheres que procuram o sistema de saúde para realizar abortos legais. Rebeca Mendes, diretora-executiva da ONG Vivas, criticou a falta de preparação dos serviços de saúde para atender vítimas de violência sexual.

Posicionamento Oficial

A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) de São Paulo afirmou que atende às demandas de procedimentos legais, comprometendo-se com o acolhimento da população. A SMS informou que o Hospital Maternidade Vila Nova Cachoeirinha continua funcionando, embora o serviço de aborto legal tenha sido suspenso.

 

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Débora Carvalho
Débora Carvalho

Uma apaixonada por histórias e uma contadora nata. Com base em Belo Horizonte, curso Jornalismo e alimento minha curiosidade incessante por notícias e cultura pop. Se você procura uma abordagem vibrante e envolvente, está no lugar certo!

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